O Tempo Próprio das Coisas

Atualmente vivemos numa sociedade tecnológica cheia de parafernálias para nos ajudar a controlar! São ferramentas úteis e muito importantes, mas por vezes, nos desconectam do SENTIR! Exercitamos tanto nosso lado mental querendo controlar a agenda, a dieta, as finanças e acabamos virando autômatos sem coração! 

Este é o cotidiano da maioria das pessoas que vai seguindo a vida, fazendo o que precisa ser feito, buscando atender expectativas… Por algum tempo eu estava seguindo esta trilha também! Mas não me sentia confortável nela! Algo em mim me dizia que o caminho não era por ali!

A partir da gravidez fui tomando maior consciência do incontrolável da vida! O meu corpo foi me mostrando que as coisas seriam MUITO diferentes dali para frente! O sentir foi se impondo, os limites do meu corpo foram se tornando mais exigentes. Assim, fui percebendo que o “controle” seria uma palavra praticamente riscada do meu dicionário!

Sentir é preciso!

Temos muito medo de sentir, por isso buscamos racionalizar ao máximo, isto é, controlar para que nada saia errado! Desta forma, damos muito mais espaço para a mente e sufocamos nosso coração, nossa intuição! Ou seja, aspectos mais sutis que fazem a diferença em nossa vida! Quando buscamos a perfeição deixamos de tentar, de errar e também de EXPERIMENTAR! Leia também Maternidade: busca por perfeição gera solidão

Certamente, a maternidade aprofundou esta consciência dentro de mim de que é preciso voar utilizando as duas asas: razão e emoção! Quando nossos filhos chegam logo demonstram que têm necessidades e urgências das quais nem fazíamos ideia! Vale salientar que este é sim um processo estafante, mas também é uma forma de largarmos a tentativa de controlar, prever e administrar as coisas roboticamente!

Minha professora de Yoga sempre me dizia que os exercícios eram uma forma de bater no corpo para desestabilizar a mente do controle! Deste modo, é preciso desconstruir esse excesso de racionalização e fortalecer nossa capacidade de SENTIR, intuir e perceber o mundo também através de nossos sentidos! Recomendo muito o documentário O poder da intuição para refletir mais profundamente a respeito da importância do sentir em nossa vida!

Fusão: tempo para construir a confiança

O medo do sentir é visível em algumas falas a respeito de bebês: “Cuidado, você está dando muito colo!”; “Fica esperta, senão ela vai chupetar seu peito!”; “Olha esse bebê vai ficar muito mimado!” Todas estas falas revelam um medo imenso de sentir, de observar o que realmente acontece! As pessoas preferem rotular ao invés de RESPEITAR aquele serzinho que acaba de chegar!

Deste modo, as pessoas pressionam a mãe para fazer assim e assado, oferecem mil conselhos e invadem uma relação que está sendo construída paulatinamente! Vale ressaltar aqui o importante papel do pai de proteger esta relação entre mãe e bebê e não permitir que terceiros invadam! Sabemos das ótimas intenções de avós e avôs, tias e tios e todo mundo, mas é preciso silêncio para que a mãe consiga se escutar, escutar seu coração e sua intuição! Que tal confiar mais na sabedoria da vida e dos instintos?!

“O bebê chega ao mundo físico trazendo notícias do mundo sutil, mas, paradoxalmente, só consegue transmiti-las à medida que suas necessidades imediatas do mundo físico são atendidas com precisão. Ele é incapaz de sobreviver no mundo da luz se não tiver qualquer necessidade física e emocional satisfeita integralmente. (…) O bem-estar ou o mal-estar fazem toda a diferença neste tempo mágico de qualquer ser humano. Atrevo-me a afirmar que é este o momento em que a humanidade é dividida entre aqueles que receberam proteção, contenção e contato corporal, e aqueles que não ganharam nada disso”. (Gutman: Mulheres visíveis, mães invisíveis p.13)

É preciso contato, presença para que se estabeleça uma relação de confiança e conexão. Sabemos bem onde nos leva a falta disto, leia também: Maternidade: uma oportunidade de curar sua criança interior!

Conexão Profunda: entre mãe e filho

Escolhi o nome Conexão Profunda para o meu blog, porque sinto que é isso que falta no mundo! Ao escrever, refletir, filosofar eu sinto que aprofundo a conexão com os conteúdos, as pessoas e tudo o que vivo!

Ao observar minha filha percebo o genuíno poder de conexão que ela me traz com a vida! Como é bonito perceber os laços que nos conectam, a forma como ela vai experimentando a si mesma e sua relação com o mundo! Assim, nesta observação, ressignifico também minha própria relação com a vida e o mundo!

Neste processo também percebo como ela me traz questões indigestas de minha própria infância para curar! É tentador bancar a sabe-tudo e tentar fugir desta sensação de desconforto. Porém, sei que o convite que minha filha me traz é uma oportunidade imensa de cura interna e desconstrução de crenças limitantes que devem remontar gerações!

Para tanto, é fundamental manter uma conexão saudável, respeitando meus limites e também os dela! É importante observar a relação de respeito e confiança que temos e perceber quando, às vezes, saio desta sintonia para “ser a mãe que esperam de mim!”. Gosto muito quando Laura Gutman diz que os filhos não precisam de uma boa mãe, mas sim de uma mãe capaz de sentí-los! Vale a pena ver o vídeo Conversamos com a psicopedagoga argentina Laura Gutman sobre o poder do discurso materno.

Acredito que apenas esta disponibilidade emocional para SENTIRMOS permite uma conexão profunda conosco e com nossos filhos! E, a partir deste pressuposto, podemos criar vínculos saudáveis e amorosos para a desconstrução de muitos padrões e crenças limitantes! Ou seja, limpamos e curamos feridas, desconstruímos padrões, e, assim, ressignificamos e construímos novas bases para uma nova história! 

Cada Escolha, uma Renúncia!

Este mergulho emocional requer respeitar o “tempo próprio das coisas!”, algo que é um luxo em nossa sociedade! Geralmente as mães precisam deixar seus pequenos aos cuidados de outras pessoas e retornar para o mundo do controle! Outras, optam por isso como uma forma de fugir deste caldeirão de emoções, desconforto e enfrentamentos! Para as mães que conseguem cuidar de seus filhos nestes primeiros anos também não é uma escolha fácil! Como diz o ditado: “cada escolha, uma renúncia!”

Seja como for, é preciso muita sabedoria e flexibilidade para administrar quaisquer das escolhas que fizermos! Neste processo o que é garantido é o crescimento e amadurecimento! Por isso, quanto mais conscientes estivermos do Agora, quanto mais conectadas aos nossos filhos, mais facilitado será este processo! Quanto mais negarmos, quanto mais medo e fuga, mais “birra” e encrenca nos espera pela frente! Tudo depende do que escolhemos e da forma que decidimos olhar para estas escolhas!

Gosto de pensar a maternidade como uma grande viagem, uma jornada cheia de trilhas e bifurcações, muitos obstáculos e perigos! Claro, há trilhas mais fáceis que levarão a caminhos mais fáceis no início e mais complicados no final. Por outro lado, há escolhas que parecem muito mais difíceis de sustentar, mas que depois se mostram grandes provas de superação!  Recomendo muito o Podcast Tenda Materna sobre autonomia para refletir mais a respeito!

A minha experiência prática

Às vezes quando paro para dar uma respirada e vejo o quanto caminhei, percebo que fiz escolhas mais dificeis e cansativas. Mas que me trouxeram à um caminho de muita conexão com minha filha e muito mais segurança como mãe! Não escolhi porque fulano ou beltrano falou, ainda que fosse pediatra! Eu pesquisei, estudei, analisei, MAS principalmente eu procurei colocar a mão no peito e SENTIR! Tarefa complicada já que não somos mais incentivadas à isso!

Existem muitos caminhos que eu gostaria de ter seguido: parto humanizado, fraldas de pano, sling, shantala… Eu idealizei vários caminhos, mas alguns não aconteceram, não sustentei, simplesmente não deu! Outros, fiz questão de me manter firme, pois SENTIA que eram importantes! Leia também Amamentação: um capítulo à parte!

Assim foi a decisão de dar “complemento” na maternidade no copinho e não na mamadeira. Assim foi a amamentação e a decisão de não dar chupeta! Assim também foi que decidi usar o BLW na introdução alimentar da minha filha. Assim foi a escolha dos alimentos que utilizamos em casa…

E por aí seguem várias trilhas que, provavelmente, me fizeram ficar muito mais cansada à primeira vista! Entretanto, quando vejo onde estamos agora, percebo que segui as trilhas certas de acordo com o meu coração! Por isso, novamente faço uma provocação: quantas vezes nos permitimos simplesmente SENTIR?!

Seja um exemplo digno de ser imitado

“Dar o exemplo não é a melhor maneira de influenciar os outros. É a única”. Albert Schweitzer

Gosto muito de ouvir a Clarissa falando sobre nossa importante tarefa de liderar nossos filhos! E aqui é importante lembrar que liderar não significa mandar, mas sim inspirar, conduzir, facilitar. E para isso, é preciso conhecer tanto a nós mesmas quanto aos nossos filhos!

Vale ressaltar que quando digo para observar e aprender com o processo de desenvolvimento dos filhos, não quero dizer para adotar uma postura passiva! Aliás, muito pelo contrário! Ao observar a si mesmo e ao seu filho, você se permite uma conexão intensa e fundamental para o processo de liderança! Quando acalmamos os “tem que…” e todas as vozes em nossa mente, toda expectativa social, atingimos um estado de consciência maior de nós mesmos e de nossos pequenos! Leia também Colocar o link Universo das Emoções: a Empatia como ferramenta!

Neste estado conseguimos tomar decisões conscientes, autogerir nossas emoções, exercitar a empatia e as habilidades sociais necessárias para redesenhar nossa rotina em direção ao que almejamos como vida, família e educação! No próximo artigo falaremos um pouco mais a respeito deste redesenho!

Gratidão pela leitura! Namastê!

SOBRE A AUTORA

Este texto foi escrito por Gisele Mendonça, cientista social, mestre em sociologia, participante do Zum Zum de Mães e, principalmente, MÃE! Tem um blog chamado Conexão Profunda, visite www.conexaoprofunda.com.br e curta a página no facebook Conexão Profunda