A maternidade me aconteceu de maneira inesperada, o dia que descobri que ia ser mãe a minha reação, confesso, não foi das melhores, ali no banheiro parada com as duas linhas rosas diante da minha cara incrédula, eu simplesmente entrei em pânico, chorei de medo, senti uma enorme insegurança e fui invadida por um mar de incertezas.
Eu não me sentia pronta para tanta responsabilidade, estava acostumada com minha liberdade, minha independência, visualizei de maneira catastrófica todas as mudanças pelas quais teria que passar em tão pouco tempo.
Pensamentos confusos vinham como uma enxurrada na minha cabeça: – Não tinha nada pronto! Não tinha médico! Nosso apartamento não tinha elevador! Eu tinha bebido, na verdade tinha tomado um porre, em um casamento dias antes, será que eu tinha estragado tudo? Era um caos interno de sentimentos misturados, senti até mesmo um pouco de raiva, cheguei a perguntar a Deus: Porque comigo? Porque agora? Tínhamos combinado que isso aconteceria mais para frente!
Mas quando caiu a noite fui acometida subitamente por um amor imenso que transbordava, amor por aquela vida ainda tão frágil que crescia silenciosamente dentro de mim. E algo como uma brisa divina passou pelo meu coração e levou embora toda aquela confusão, essa brisa reconfortante ainda trouxe com ela um enorme senso de responsabilidade e gratidão, me senti especial e honrada por ter sido escolhida por Deus e pela minha filha para aquela tarefa tão sublime!
Naquela mesma noite, deitados no sofá, eu e meu marido decidimos que daríamos conta, que resolveríamos tudo e faríamos de tudo para receber essa criança com amor e respeito. Mas eu continuava com um frio na barriga e sabia que a partir daquele momento tudo seria diferente.
Daquele dia até hoje muitas coisas se passaram, o parto e suas dores, amamentação em toda sua plenitude, a neblina do puerpério, a desastrosa introdução alimentar, a sofrida (para mim) adaptação escolar, e muitos outros momentos desafiadores, que eu espero ter oportunidade e inspiração para um dia escrever sobre eles, mas nesse primeiro momento gostaria de uma maneira geral contar como cheguei até aqui no Bee Family e também compartilhar algumas reflexões sobre a maternidade.
Tudo começou com uma amiga, que tinha se tornado mãe há uns dois anos e pouco antes de mim, ela nos visitou algumas vezes durante minha licença maternidade, sempre muito cautelosa verificava o melhor horário e se era um bom dia para visitas, combinávamos de manhãzinha e ela levava pãozinho de queijo quentinho e sempre me oferecia conforto e apoio com sua escuta sem julgamentos. Em nossas deliciosas conversas matinais apareceram algumas palavras como conexão, rede de apoio materno, disciplina positiva, criação com apego e outras que ficaram guardadas e reverberando aqui dentro, lembro dela ter comentado especificamente dos trabalhos da Clarissa Yakiara e também do Thiago Queiroz (Paizinho, Virgula!). A partir daí de blog em blog de página em página, com um monte de teorias, pensamentos e ideias dispersas cheguei aqui no Bee Family…. Logo me inscrevi no Workshop gratuito e depois na turma 5 do Zum Zum de Mães. Posso dizer que foi um grande divisor de águas para mim.
Dizem que quando nasce uma criança nasce também uma mãe, isso é verdade, ainda me lembro daquele primeiro contato fora da barriga, olhos nos olhos pela primeira vez, parecia que tínhamos parado o tempo, eu estava exausta depois de tantas horas de trabalho de parto, quando ela chegou eu só tive lagrimas e meu colo para oferecer.
Ela ficou ali quietinha e confortável, ainda me olhando nos olhos, sendo alimentada e aquecida por aquela Vivian que acabara de despertar seus instintos mais primitivos de fêmea mamífera, sim é verdade eu nasci ali naquele dia junto com a minha filha. Talvez esse nosso começo visceral e poderoso tenha ajudado, mas acho que somente despertei para uma maternidade mais consciente e presente quando o universo conspirou para que houvesse um encontro da minha vontade com esse lugar, que me forneceu os conhecimentos e as referências que ainda me faltavam. Sou muito grata por ter encontrado a Bee Family e o Zum Zum, que para mim foram os pontos de partida de um novo caminho.
E para tornar esse caminho ainda mais especial, tive a sorte de enfim encontrar minha tribo, encontrei outras mulheres (no mundo virtual, no meu convívio e até mesmo na minha própria família) corajosamente dispostas e comprometidas a questionamentos profundos sobre quem são e sobre que tipo de relação querem construir com seus filhos.
Após o Zum Zum ficou muito claro para mim que não é possível uma maternidade consciente se não estivermos conectas e atentas a nós mesmas e as nossas necessidades. Se a criança que fomos um dia não estiver sendo ouvida, se elas estiverem sendo caladas novamente, vamos continuar andando em círculos e repetindo automaticamente o comportamento de outras gerações, que viveram em um tempo e em um mundo muito diferente daquele que podemos construir.
Sinto que estamos no alvorecer de uma nova Era, e as crianças que estão chegando estão predestinadas a nos redefinir como humanidade e precisam encontrar um terreno fértil para desabrocharem seus verdadeiros eus, sinto que essa energia vital e genuína que vem com elas precisa fluir mais livremente do que nunca. Percebo que elas nunca se adaptarão a comunicação e atitudes violentas e retrógradas, entendo o tamanho da responsabilidade que me cabe como mãe e como parte da sociedade em que vivo.
Por tudo isso eu continuo na busca, avanço lentamente por esse caminho de empatia e respeito pela minha filha e pela minha criança interior, alguns passos para frente, muitos outros para traz, sigo errando miseravelmente em alguns desafios e acertando gloriosamente em outros. Tenho buscado cada vez mais conhecimentos e ferramentas que me apoiem e auxiliem nesse processo de mudanças, não tenho pretensão alguma de me tornar uma mãe perfeita, mas tento me tornar uma mãe cada vez mais presente e consciente.
Um dia antes do dia das mães, acordei com uma enorme necessidade de introspecção, de ir para dentro e transcrever o que sentia em relação a aproximação daquela data especial. Então fiz uma breve reflexão sobre como vejo a maternidade e como ela vem me transformando e é com uma certa timidez que compartilho essa reflexão aqui com vocês.
A maternidade me desnuda a alma, me arranca o véu de Isis, me desmascara, me joga na cara quem eu sou e quem eu não sou, me faz emergir do oceano de mim mesma. Porém vez por outra ainda traz à tona a fera descontrolada e indomável que reage apenas por extinto, e em seguida vira o outro lado dessa mesma moeda que é a face da beata martirizada nas renúncias diárias.
A maternidade me inunda de luz, tanta luz que ilumina até onde não deve, ilumina aquela sombra, aquele canto antes escuro, onde desde de menina eu vinha guardando o que doía, o que eu achava que não servia, o que eu não sabia lidar ou nomear e agora aos poucos esses guardados cheios de poeira vão sendo limpos, arrumados e reintegrados…
A maternidade me impulsiona a sair em urgente missão de resgate daquela criança que fui um dia, ela me permite revisitar minha infância, ser criança de novo, não de maneira a ofuscar o protagonismo da infância da minha filha, mas de forma a possibilitar a verdadeira empatia e conexão entre nós, tornando nosso vínculo indestrutível. Ela me faz olhar o mundo com olhos de primeira vez, me desperta uma vontade de fazer melhor, de ser a melhor de todas as minhas versões! As vezes ela dói e as vezes não…
Ela me faz reviver velhas histórias, me aproxima das minhas ancestrais, incríveis mulheres de fibra, algumas que eu sequer conheci, mas as reconheço em mim, as honro, honro o meu passado, porém a maternidade me permite pedir licença e seguir em frente reescrevendo minha história, rompendo com os velhos padrões, com os velhos ciclos, desbravando um novo caminho, tão necessário para o romper da nova Era que se anuncia…
A maternidade me permite sobretudo compreender minha mãe e a imensidão do amor que ela tem por mim, desvendando os segredos por traz daquelas lágrimas silenciosas e incompreendidas, validando seus medos que antes pareciam tolos, me permite aceitar e perdoar seus erros bem intencionados e reconhecer sua solidão mesmo em meio à multidão, me faz valorizar ainda mais seus sorrisos, suas noites, sua devoção e o seu coração.
Vivian Pessoa @viviancpessoa
Mãe da Ive de 2 anos e 3 meses e participante da turma 5 do Zum Zum de mães.