Inicialmente, vale a pena definir o termo projeção segundo as intenções deste texto: tudo o que temos dentro e colocamos para fora em outro ser, no caso, nossos filhos! Segundo a teoria de Freud trata-se de um mecanismo de defesa psicológica para aliviar a ansiedade que temos por sentimentos dolorosos ou desagradáveis.
Este mecanismo de defesa é mais utilizado do que imaginamos! Vale a pena ler o artigo Brasil na Copa: vamos refletir sobre as projeções? Ao refletir sobre o desafio de educar, fica visível vários aspectos destas projeções! Se estivermos realmente comprometidos com um processo de auto-observação e auto-educação, perceberemos facilmente este mecanismo. Afinal, quantas vezes projetamos nossos sonhos, expectativas, medos e frustrações sobre nossos filhos?!
Quem nunca viu uma mãe obcecada com a ideia de que a filha seja modelo, bailarina ou atriz? Este é o estereótipo mais caricato da projeção entre mães e filhas! Outro exemplo interessante é mostrado de maneira muito sensível no filme Billy Elliot, em que o pai que sonhava com o boxe, precisou se render ao talento natural do filho para o ballet!
Nestes exemplos, nossa tendência imediata é pensar como as pessoas podem projetar seus sonhos nos filhos, sem considerar a vontade deles! Aqui, confesso que sempre olhei o filme pela ótica do filho(a) que tinha seu sonho podado pelos desejos dos pais! Contudo, após a maternidade sou convidada a olhar a questão novamente, com mais atenção, buscando observar e identificar a ferida destes pais!
A partir deste exercício, eu consigo perceber que os pais estão ainda presos em suas respectivas crianças feridas! Leia também Pedidos deslocados: as consequências das necessidades não atendidas. Desta forma, eles têm muita dificuldade para enxergar os próprios filhos e permitir que eles desenvolvam seus próprios talentos e habilidades! Tudo o que estes pais estão projetando em seus filhos é a vontade de serem aceitos, amados e terem seu valor reconhecido!
Vale ressaltar que observar e identificar nossos movimentos ao educar nossos filhos é fundamental para que possamos diferenciar o mapa e o território! Por vezes, caminhamos por lugares de muita dor e, se não estivermos atentos, a tendência automática é reproduzir padrões conforme analisamos no post Merecimento e Maternidade.
Assim, é preciso observar a coerência entre o que pensamos, falamos e fazemos! Como gosta de dizer a Clarissa “É preciso ser um exemplo digno de ser imitado!” E, realmente concordo, que a única forma de liderar efetivamente seja pelo exemplo!
Neste ponto, percebo que é mais fácil identificar quando projetamos sonhos e expectativas! Você sonha com a carreira profissional de seu filho? Faz questão de colocar o boletim dele nas redes sociais? Cuidado! Este pode ser um sinal de alerta de projeção! Observe-se e perceba quais as emoções que são mobilizadas em você quando isso acontece? Orgulho, merecimento, satisfação, reconhecimento? Talvez, tudo o que você gostaria de ter sentido na infância e não aconteceu?!
Ah, como é complicado escrever sobre “Ego”! Tão defendido por nós, tão demonizado pelas religiões e linhas espiritualistas! Aqui vou trabalhar a ideia de ego da perspectiva de que é outro mecanismo de defesa, que busca apenas nos proteger do sofrimento! Ou seja, trata-se de uma máscara que colocamos para nos blindar de vivenciar algo que pode ser doloroso novamente!
Por este ângulo de visão, o ego sustenta uma imagem “gostosa” de nós mesmos, nos faz ficar mais confortáveis para a exposição e o relacionamento social! No entanto, quando nascem nossos pequenos este centro de controle e poder fica fragilizado. Francamente, não sei se acontece isso com todo mundo, acho que não! Mas o meu mundo interno ficou muito tumultuado e me senti muito exposta, sem conseguir esconder mais minhas fragilidades! Na verdade, eu me senti tirando muitas máscaras e precisando olhar para a vida sem todas as armaduras que eu havia usado até então!
Assim, confesso que tentei colocar muitas máscaras novamente, mas ou ficavam largas ou apertadas! Neste sentido, percebo que o convite de minha filha era sempre para olhar para a ferida aberta e parar de querer fingir que estava tudo bem! Recentemente, me perguntaram quem eu gostaria de ser no futuro! E eu respondi: eu mesma! E a pessoa me olhou sem entender, mas naquele momento percebi toda a coragem do trabalho interno que eu estou fazendo! Quero ser eu mesma em toda minha inteireza, luz e sombras, integrando todas as minhas partes e reconhecendo todo valor que tenho no mundo enquanto pessoa única que sou!
Iniciei 2019 fazendo uma jornada de reflexão sobre merecimento em meu blog Conexão Profunda! Durante estes meses, tenho trabalhado arduamente para ressignificar a ideia de merecimento que tenho internalizada! Nesta caminhada tenho olhado para muitas feridas de minha criança que eu ainda não tinha me apropriado! Noto que fiquei muito tempo parada no movimento de acusação de meus pais, apesar de estar exausta de saber que eles fizeram o que puderam com a consciência que tinham!
Agora, percebo que estive estacionada neste movimento porque era o que eu suportava neste momento. Ou seja, projetar nos outros nossos medos, raivas e frustrações às vezes é a única coisa que conseguimos fazer! A grande sacada é estar atento ao processo, se permitindo e se dando amor para dissolver essas camadas de ferida!
“É preciso sentir para curar!”, frase de Domingos Cunha muito utilizada por Tatiane Guedes! Esta frase ressoa profundamente dentro de mim! As projeções são formas que utilizamos para fugir de nossas feridas! Infelizmente, se não tomarmos consciência delas, acabamos por perpetuá-las em nosso sistema familiar! Leia Merecimento e Limpeza de Padrões Familiares
Atualmente, estou lendo um livro que está iluminando muito minha perspectiva das coisas! A Coragem de Ser Imperfeito de Brené Brown trouxe à tona questões muito profundas, feridas de minha criança. Ou melhor, feridas de NOSSAS CRIANÇAS que não soubemos ainda como curar! Um dos conceitos centrais do livro é a vergonha, um sentimento que poucos conseguem admitir, mas é universal! Inclusive, é muito enfatizado em nossa sociedade como forma de nos fazer obedecer às regras, consumir e dita também muito de nosso comportamento!
Todos nós sentimos vergonha e procuramos formas de não entrar em contato com ela! Em geral, utilizamos máscaras para encobrir nossas fragilidades, nossos medos e o que a autora conceitua como VULNERABILIDADE! Neste ponto, trago a seguinte reflexão: quanto de nossa vulnerabilidade mostramos aos nossos filhos? Esta pergunta traz o incômodo de que, muitas vezes, nem nós mesmos nos permitimos acessar a nossa vulnerabilidade! E isso ocorre pelo nosso grande medo da escassez!
Agora, faço um convite: o que é escassez para você? Dinheiro, tempo, carinho, comida, seja lá o que você responder estará atrelada à ideia de medo! Todos nós viemos de gerações que passaram alguma situação de escassez e procuraram criar um alerta dentro de nós para que não vivéssemos o mesmo problema! Assim, esta escassez, ou seja, o medo da insuficiência seja lá em que aspecto for ronda nossa vida 24 horas por dia!
Sob este prisma, a autora monta o que considera ser a fórmula da escassez cujos componentes são: vergonha, comparação e desmotivação.
Vale a pena lembrar das experiências de vergonha, do sentimento envolvido e de toda forma de controle associada a isso. Particularmente, e acho que não seja exclusividade minha, tenho lembranças muito dolorosas dos tempos de escola. Por muito tempo e, infelizmente, ainda sobrevive uma ideia de que a vergonha é uma forma de controle social. Conforme a autora nos convida a refletir pelos questionamentos a seguir:
“O medo do ridículo e a depreciação são usados para controlar as pessoas e mantê-las na linha? Apontar culpados é uma prática comum? O valor de alguém está ligado ao sucesso, à produtividade ou à obediência?” Brown: 2013, p.25)
Agora, convido a refletir de que forma nossas projeções estão relacionadas à vergonha e o medo da escassez que sentimos no fundo de nossa alma. Quantas vezes usamos este tipo de mecanismo como a vergonha para fazer nossos filhos caminharem por territórios que julgamos mais seguros? Mas que oprimem e impedem que estes seres tão especiais tragam aquilo que é único e vibrante em sua Essência?
Outro elemento que se retroalimenta da vergonha é a comparação. Ah, quem de nós não tem mágoas relacionada à comparações na época da infância? Apesar de me policiar neste aspecto, já me peguei comparando minha filha e pensando se está tudo ok com o desenvolvimento dela! Desde muito cedo fomos ensinados a ser validados pelo externo! E a autora provoca:
“A criatividade tem sido sufocada? As pessoas são confinadas a padrões estreitos em vez de serem valorizadas por suas contribuições e talentos específicos?” (Brown: 2013, p.25)
Apesar de um movimento de maior consciência, percebo que temos muita dificuldade em concentrar o olhar para dentro e valorizar o que é único. Infelizmente, ainda temos um desejo de competir, de vencer, de ficar por cima! Isso apenas contribui para que criemos um ambiente de guerra!
Acredito que é preciso pensar na sustentabilidade das relações, criar pessoas saudáveis que saibam o seu valor e o seu lugar no mundo, independente de qualquer comparação! Ou seja, acredito que é preciso colocar uma consciência de valor intrínseco em nossos filhos. Isto é, eles são merecedores pelo simples fato de existirem, são únicos e não precisam provar nada para ninguém! A partir disso, estas crianças estarão aptas à construir o mundo que desejam ao invés de estarem defensivas e reativas com medo da insuficiência e escassez do mundo da forma que NÓS descrevemos para elas!
Gratidão pela leitura! Namastê!
SOBRE A AUTORA
Este texto foi escrito por Gisele Mendonça, cientista social, mestre em sociologia, participante do Zum Zum de Mães e, principalmente, MÃE! Tem um blog chamado Conexão Profunda, visite www.conexaoprofunda.com.br e curta a página no facebook Conexão Profunda e siga no instagram gm_conexaoprofunda