A loira do banheiro

No banheiro de um restaurante, eu e meu filho de dois anos lavávamos as mãos na pia quando entrou uma loira alta, esbanjando beleza, com sua filha de aproximadamente cinco anos.

-Olá.

-Olá.

A menina branquinha de tranças nos cabelos tinha as bochechas rosadas combinantes com o macacão cor-de rosa e cinturado da mãe.

Eu já de saída, ameacei um “Tchau”.

-Por favor, você poderia abrir o zíper das minhas costas?

-Pois não, claro. Pronto?

-Não, desça tudo, até embaixo.

-Ah, tá.

Rubra se torna a minha face de levar as mãos até o bumbum da loira e o alívio foi imediato, meu e dela.

-Obrigada.

-De nada.

Enfim de saída, fui pegar as mãos do meu filho, quando o percebi longe de mim, parado, como os olhos estatelados fitando tranquilamente a tal loira fazer xixi.

Para a minha surpresa a cabine do banheiro estava completamente aberta e eu pude entender a admiração do meu filho, não de ver a moça praticamente pelada só de sutiã, mas de ver a sensação de libertação que ela emitia com o semblante ao eliminar um xixi longo e sufocado.

Jamais imaginei vivenciar tamanha intimidade com uma desconhecida.

Olhei para a cabine ao lado, vazia, para disfarçar a troca de olhares e entendi o ocorrido.

A cabine era pequena demais para mãe e filha juntas, então ela precisou deixar a porta aberta para não perder a filha de vista.

E quer saber, o banheiro era feminino, não era? Então qual o problema?

O pudor era meu e somente meu e a mania de complicar o descomplicado também.

E como é bom ver alguém na sua inteireza, onde quer que esteja. A maternidade descomplicada, pura, com fé e coragem nas próprias decisões.

Ser estrangeira do outro é natural, mas não posso aceitar ser estrangeira de mim mesma.

É, a loira não sabe, mas me ensinou sobre aceitação.

Poderia dizer que conheci a louca do banheiro, a pervertida da cabine ou a sem-noção do xixi.

Mas prefiro dizer que conheci uma mulher admirável, uma mãe que facilita a maternidade e usa o pragmatismo a seu favor. Uma mãe que simplesmente faz e acontece, alcança o seu objetivo, sem colocar mais pedras no caminho.

É inevitável me imaginar naquela situação “meu filho esmagado comigo na cabine, no meu colo, na minha cabeça, onde quer que seja, chorando ou não, para que eu pudesse me despir em paz”.

Talvez eu não fizesse xixi ali, procurasse alguém para olhar meu filho ou outro banheiro. E talvez ficasse procurando, procurando, procurando….ops, parece que fiz xixi nas calças.

O aprendizado da maternidade pode até estar em livros, teorias, tratados, mas o coração só entende quando se depara com o dia a dia, com as mulheres que o Brasil têm, nos banheiros de cada esquina.

 

SOBRE A AUTORA:

Este texto foi escrito por Lígia Freitas, Mãe do João e Participante do Zum Zum de Mães.

@ligiafreitasescritora