Com que máscara eu vou…

Eu uso máscaras a todo o momento e nesta época de isolamento social tenho refletido sobre como será quando a pandemia acabar. Sim, quando tudo voltar ao “normal” porque acredito que as coisas irão se organizar novamente, mas não sei se posso dizer que tudo será como antes. Agora me escondo sob as máscaras de proteção, de pano, de feltro ou de acrílico. Feias ou bonitas, sustentáveis ou decoradas. Se eu quiser posso não sorrir que poucos perceberão, também posso desdenhar de algumas opiniões já que não verão a minha boca se contraindo. Aos mais sensíveis, meus olhos revelarão minhas expressões mais íntimas, aos demais, a máscara física me encobrirá. Entro nesta primeira segunda-feira de maio na oitava semana de isolamento e por aqui muitas máscaras caíram, outras começam a ruir. Sinto que as energias que atuavam fortemente para evitar que determinadas emoções e comportamentos emergissem tem se exaurido, porque tem faltado espaço para me esconder. E junto do cansaço as máscaras também caem. Está difícil não demonstrar medo, irritação, discordância, pânico, desanimo. E, sinceramente, isto tem me feito tão bem! Parece que tenho tirado uma tonelada de peso das minhas costas, esvaziando minha mochila cheia de “máscaras” desnecessárias. Que delicia poder extravasar e demonstrar, além de não conseguir esconder, agora temos a desculpa de que são os efeitos da “quarentena”, e que tudo e todos estão perdoados. De qualquer forma, é bom demais, poder mostrar um pouco de quem eu sou de verdade, sem precisar fingir, enganar, atuar, sorrir! Mas, é claro que nem tudo são flores porque tenho inúmeros defeitos e sentimentos não aceitos em nossa sociedade e quando os expresso me sinto frágil, fraca, vulnerável (ainda não sei entender muito bem minha vulnerabilidade) e sinto que ninguém mais vai me amar. Já aprendi com a mente racional que se trata da minha criança interior ferida e rejeitada que ainda pede por ser amada, aceita e reconhecida. Porém, nestas horas de conflito interno, meu coração ainda não aprendeu a acolher esta pequena na sua totalidade e ainda tenho um longo percurso a limpar nesta jornada de cuidar da “Ana Banana” (nome carinhoso da minha criança interior!) que chora e se debate na “estrada”…

E AS CRIANÇAS SERÁ QUE ELAS SABEM?

Tenho passado muito tempo sozinha com minha filha de três anos, pois meu marido trabalha na área da saúde e intensificou seus plantões neste momento. Esta “imersão em educação” me fez passar por muitos espaços. Primeiro, por um desespero avassalador por achar que eu não conseguiria sobreviver, nem descansar, nem dar conta das atividades de casa e do trabalho. Um terror em pensar que estaria com minha filha 24 horas por dia e desesperada por não conseguir estar presente e estabelecer uma conexão saudável entre nós. Depois, com o passar do tempo, fomos acessando outros espaços em que fui incluindo a menina nas atividades e buscando algumas frações de tempo para mim. É querida leitora, se você é mãe me entende e sabe que expectativas altas causam frustração, aprendi a valorizar cada instante em que posso me cuidar e me ver, no meio do dia para não explodir “tanto”. E está sendo tão aterrorizante ver que, ao mínimo sinal de minha raiva, minha filha já percebe que vou me descontrolar. Sim ela parece uma “antena captadora de emoções” que sente a minha mudança de comportamento, acho que até antes de mim. Penso que na realidade é e sempre foi assim com as crianças, acredito que elas são muito sensíveis e a sua percepção é inexplicável aos céticos, no entanto, agora tenho tido tempo e oportunidade de ver com os olhos do coração. Bom, digo aterrorizante porque imagino como será após voltarmos para a nossa rotina “normal”. Quando o isolamento acabar com que máscara eu vou? Como irei me esconder? E será possível me encobrir depois de tanta revelação? E a pergunta que acho mais importante: Eu quero mesmo me esconder? Se foi tão bom me revelar, quem me amar vai permanecer! E os pequenos, eles não vão embora nunca, eles estão ali firmes, prontos para nos apoiar e nos amparar. Logo nós, adultos, cujo papel é cuidar e proteger. Minha filha sente minha dor e de imediato ela diz que me ama e que me adora, é como um abraço bem forte que ela me dá, ela sabe como me acolher, como cuidar da minha dor, coisa que nem eu sei fazer direito ainda.

AS MÁSCARAS NECESSÁRIAS

Eu acredito que um mundo melhor está por vir. Penso que estamos vivendo um marco histórico e que ninguém sairá ileso, ainda que não seja contaminado pelo tal vírus. Nossa estrutura interna e externa se alterará de formas ainda não vivenciadas. Até pouco tempo eu acreditava que era preciso viver “papeis” na vida e que estes personagens nos permitiam sobreviver aos eventos diários. A maternidade e isolamento me mostram e me revelam a cada dia que as máscaras são desnecessárias, eu sinto que ao me desmascarar eu me mostro e que me mostrando eu me vejo e que somente aí eu tenho a oportunidade de me ressignificar. Hoje, acredito na “cara limpa”, no coração vivo, nos sentimentos à flor da pele e ao me enxergar sem filtro, vejo muita dor, raiva, imperfeição, mas vejo também muita força para renovar, mudar, agir. Assim, quando a quarentena acabar de máscara é que eu não vou sair!

SOBRE A AUTORA: 

Ana Blasi, Mãe da Flávia, Participante da Turma 9 do Zum Zum de Mães e apaixonada por educação e conexão.

IG @blasi_ana

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