Depois de uma boa noite de sexo, sentei-me à mesa do café da manhã, como quem acaba de encarnar Buda.
Minha mente zen fez cócegas no meu autoboicote e em tudo que eu julgo difícil, complicado ou impossível.
Meu marido sentou-se à minha frente e me deu uma piscadela, como quem queria rir da nossa noite ou apenas continuar aquele gozo dia afora.
Tentamos comer sem pressa, ao som da Galinha Pintadinha e de vários esbarrões nas cadeiras, daquele menininho lindo correndo em volta da mesa.
Um grito tomou conta do ambiente. Um tombo, um mau jeito na perna do meu filho e um choro longo, desses de novela mexicana. Sentei-me delicadamente no chão, na intenção de mostrar o meu apoio por ele e fiz um gesto com os olhos, para demonstrar compaixão.
Não estava acreditando na minha tranquilidade, em momentos como esse como seria o meu comportamento? Correr para pegar o gelo, abanar, assoprar, beijar, gritar, assustá-lo ainda mais.
Tive a sensação de sair do meu próprio corpo para me observar. “Ei, você? Tomou alguma droga, chegou da aula de yoga, está em estado de transe com o corpo celestial da paz?”
É, não estava me reconhecendo, e obviamente o meu filho também não. Em poucos segundos ele parou de chorar e devolveu-me um olhar de cumplicidade. O silêncio parecia tomar conta do seu pensamento e prepara-lo novamente para a próxima brincadeira.
Lembrei-me do café na xícara, já gelado, mas não me importei, bebi com gosto, desejo de molhar os lábios. Se fosse outro dia, talvez reclamasse da temperatura e do gosto amargo.
Sim, a sensação de “good vibes” soava falso, mas eu sabia que não era.
Um súbito pensamento me ocorreu. O sexo, como fonte máxima de prazer, conexão e entrega teria esse poder de tirar os meus pés do chão?
Aliás, ouso indagar se qualquer caminho de entrega fiel e libertadora não teria esse mesmo efeito avassalador.
Não me chamem de herege, mas vou comparar o sexo com a religião.
Sou religiosa, mas jamais me encontrei em um estado de crença tão sublime a ponto de mudar a minha vida, mas sou testemunha de que algumas pessoas já passaram por essa situação.
Conheci um homem que morreria em seis meses, segundo a medicina, mas morreu apenas dez anos depois, simplesmente porque tinha muita fé, algo transcendental, que não se explica. Apenas se agradece, pois engrandece.
A meditação também gera essa transcendentalidade. É uma filosofia de vida, que quando praticada em alto nível coloca a pessoa em sintonia máxima da mente com o corpo humano.
Já ouvi dizer que os monges não fazem sexo, porque encontram essa plenitude máxima de paz interior quando estão meditando.
Sem maiores julgamentos às crenças e aos costumes religiosos ou meditativos, o fato é que ainda não consegui alcançar essa plenitude máxima com a meditação ou religião.
Oxalá, meu marido, que pode se dar bem nessa, caso eu passe a acreditar que preciso de sexo para ficar zen.
Brincadeiras à parte, esta reflexão serviu para me mostrar o caminho da entrega. Talvez eu não soubesse antes da maternidade o que era me despir sem medo de ser feliz.
E não é só isso, talvez me falte transar com a própria vida, valorizar mais meu tempo com o meu filho, amigos e família.
Transar no dicionário é também: “gostar de, deleitar-se com, apreciar”.
É isso, TRANSEMOS MAIS!
Esse texto foi escrito por Lígia Freitas, Mãe do João e Participante do Zum Zum de Mães.
@ligiafreitasescritora