Já comentei com vocês em textos anteriores que a maternidade me deu um super presente, a oportunidade do Autoconhecimento. Todavia, não é por que é um presente, que significa que seja fácil, leve e gostoso. Autoconhecimento é olhar para dentro, o que, na maioria das vezes, exige de nós muita coragem. E além disso, não somos acostumados a olhar para nós mesmos. Pelo contrário, desde crianças somos estimulados a olhar cada vez mais para fora.
É a televisão, o móbile em cima do berço ou do carrinho, os mil brinquedos que piscam e cantam, o tablete, o celular… E quando entramos em contato com alguma emoção, somos rapidamente conduzidos a esquecê-las. “Ah, isso não foi nada… um raladinho no joelho nem dói tanto assim!”.
Oi? Como assim? Desde quando o adulto tem a capacidade de mensurar a dor de um ralado no joelho?
E nas relações a situação é bem parecida, pois aprendemos com nossos pais que nós somos os responsáveis por faze-los felizes ou tristes. Quem aqui nunca ouviu de seus pais: “A mamãe está muito triste com você por que você não guardou os brinquedos.”ou “O papai está muito triste com você por que você gritou comigo.”?
O fato é que, assim vamos crescendo, e aprendendo a olhar cada vez mais para o lado de fora, cada vez mais para o outro.
Quando nos tornamos mães e estamos dentro do olho do furacão chamado puerpério, fica mais difícil ainda olhar para si.
-É o bebê que só chora,
-É o bebê que não dorme,
-É o bebê que só quer peito,
-É o marido que não colabora e não entende,
-É o palpite/conselho/pitaco da mãe, da sogra, da vizinha, da amiga,
-É o médico que receitou leite artificial…
Percebem que é sempre o outro? E o que nós podemos fazer em relação ao outro? NADA, absolutamente NADA.
Ainda não temos o dom de transformar o outro pelo simples fato de acharmos que ele nos incomoda, ainda que este outro seja apenas um bebê. Mas temos um grande privilégio, que é o de enxergar no outro aquilo que está em mim e pode ser mudado.
De acordo com a escritora Laura Gutman, quando nasce um bebê pensamos logo em separação, pois o corpo que antes estava dentro da mãe, alimentando-se com ela do mesmo sangue e compartilhando as mesmas emoções, após o nascimento começa a funcionar de maneira independente. Sobretudo, este recém-nascido não é apenas um corpo físico. Ele é também um corpo emocional e espiritual, e esta separação não é tão simples assim como a separação física. Em seu livro, A Maternidade e o Encontro com a Própria Sombra, Laura diz: “Esse recém-nascido, saído das entranhas físicas e espirituais da mãe, ainda faz parte do entorno emocional no qual está submerso. Pelo fato de ainda não ter começado a desenvolver o intelecto, conserva suas capacidades intuitivas, telepáticas, sutis, que estão absolutamente conectadas com a alma da mãe. Portanto, esse bebê se constitui de um sistema de representação da alma materna. Dito de outro modo, o bebê vive como se fosse dele tudo aquilo que a mãe sente e recorda, aquilo que a preocupa ou que ela rejeita. Porque, nesse sentido, são dois seres em um.”. E Laura ainda complementa: “E o mais incrível é que o bebê sente como próprio tudo o que sua mãe sente, sobretudo o que ela não consegue reconhecer, aquilo que não reside em sua consciência, o que relegou à sombra.”
De acordo com Carl Gustav Jung, a sombra refere-se às partes desconhecidas da nossa psique e, também, àquelas de nosso mundo espiritual que são desconhecidas. Cada ser humano tem o propósito de passar por esta vida em busca da sua sombra, com o objetivo de trazê-la para luz, curar-se e ser quem realmente veio para ser.
Por isso, tendo todas as suas necessidades básicas atendidas com amor e apego, precisamos estar atentas nos casos de bebês que choram demais, que têm dificuldades para dormir, que rejeitam o seio, que não se conectam, que sempre adoecem. O olhar deve ser sempre para nós mesmas, a mãe. Por que choro tanto? (Ou por que quero chorar?) O que tem me tirado o sono? Por que inconscientemente estou rejeitando meu bebê? Que pensamentos tenho alimentado em minha mente? São perguntas bastante desafiadoras, com respostas bem particulares e que residem no interior de cada uma de nós, mães, mesmo que não sejam tão evidentes.
Quando mantemos nosso olhar focado no bebê, as respostas não vem, e continuamos nos colocando no papel de vítima, de mãe coitadinha
Quando o bebê começa a aprender a se deslocar, por volta dos nove meses, a fusão emocional começa a se transformar, de modo que os bebês vão criando laços com outras pessoas e se fundindo com elas também (pai, irmãos, cuidador, objeto que tem em mãos…) Todavia, é só perto dos dois anos e meio que inicia-se de fato a lenta separação emocional, quando começa o desenvolvimento verbal e a criança já consegue se identificar como “eu”. Este processo de separação emocional será concluído apenas na adolescência, entre treze e quatorze anos. Até então, o nosso estado emocional influencia diretamente o estado emocional de nossos filhos.
Neste sentido, conseguem perceber a importância de olharmos para nós mesmas quando julgamos que algo não esta bem com nossos filhos?
Também conhecida como Lei do Espelho, esta lei bastante difundida na psicologia, diz que aquilo que no outro mais me incomoda, está na verdade dentro de mim. Você pode me perguntar: “Como assim? Eu estou dizendo que me irrita demais pessoas que se atrasam, e você está dizendo que eu que me atraso? Não! Eu sou super pontual exatamente pelo fato de abominar atrasos.”
Eu te respondo: se observe, olhe para dentro de si mesma. Não olhe para fora.
Você pode ser extremamente pontual com os compromissos que firma com os outros, mas e com os compromissos que firma consigo? Você colocou o despertador para tocar 30min mais cedo do que o de costume, pois firmou com você o compromisso de se exercitar ou meditar diariamente ao acordar. O despertador toca, você desliga, resolve dormir mais um pouquinho. Será que isso é ser pontual com você?
Por aqui, um dos grandes desafios é lidar com as diferenças na maneira de educar os filhos. Fico extremamente irritada com ameaças, castigos, chantagens. Sempre que acontece algum desentendimento neste sentido, me sinto completamente frustrada, frágil, incapaz. Coloco no outro a expectativa de ser alguém completamente controlado e emocionalmente equilibrado, que são as mesmas expectativas que tenho com relação a mim mesma. É só quando a poeira abaixa que percebo o quanto muitas vezes minha vontade é fazer exatamente o mesmo, chantagear, ameaçar, castigar. Quando olho para mim, percebo o quanto muitas vezes me castigo por me julgar não ser uma boa mãe. Para ficar mais claro, várias vezes deixo de fazer alguma coisa que eu gostaria muito, algo que me dá prazer, por achar que não mereço. Percebem como inconscientemente estou me punindo?
É por isso que quando a gente tira o nosso olhar do outro e começa a olhar para si, a mágica acontece. Começamos a entender melhor o nosso comportamento, ter consciência das nossas ações. Assim, podemos nos transformar. Quando nos transformamos, as nossas relações se transformam, seja com nossos filhos, companheiro, pais, amigos, vizinhos. Todo o mundo ao nosso redor se transforma. Saímos do papel de vítima, (de mãe coitadinha que o filhos só chora, não dorme, não obedece, que o marido não colabora) para o de heroína de nós mesmas. É libertador!
Hoje em dia muito temos ouvido falar sobre autorresponsabilidade, e para mim, a autorresponsabilidade é exatamente isso, olhar para si. Tirar o foco do outro, deixar de responsabilizar o outro pela sua situação atual. E aqui, entende-se pelo outro seus filhos, seu marido, seu vizinho, seus pais, seus irmãos, o governo, o seu chefe. Colocar-se como responsável total por tudo que acontece com você, inclusive seus sentimentos, é fundamental para que você tome as rédeas da sua vida e seja feliz.
Lá no inicio do texto eu comentei que quando crianças costumávamos ouvir de nossos pais que os deixamos tristes por alguma razão ou outra. Muitas vezes tendemos a repetir isso com nossos filhos. Percebem o peso que impomos às nossas crianças, depositando nelas toda a responsabilidade por nossa tristeza, raiva, frustração ou mesmo felicidade? Diante disto, você pode querer me questionar: “Mas eu não posso ficar triste diante de um mau comportamento do meu filho, ou de qualquer outra pessoa?”. É claro que pode! E deve! Nossos sentimentos devem ser expressados se não quisermos adoecer. Porém é preciso cautela no modo como os expressamos. Observem os dois exemplos a seguir:
Notam a diferença? No primeiro exemplo o foco está no outro. Eu responsabilizo o outro pela minha tristeza. No segundo caso o foco está em mim. Eu sou a responsável pelo meu sentimento, pois eu não gosto que gritem comigo.
Situações deste tipo acontecem frequentemente não só na relação mães e filhos, mas em todas as relações. Costumamos responsabilizar o outro pelos nossos sentimentos. E mais uma vez eu pergunto: O que podemos fazer com relação ao outro? NADA.
A única coisa que podemos fazer (por nós e não pelo outro) é ter clareza a respeito do que nos desperta cada sentimento, e comunicar isso de forma clara para o outro. Talvez possa ajudar em alguns casos. E só conseguiremos ter essa clareza de uma única maneira, olhando para nós mesmas ao invés de olhar para o outro.
Por isso, insisto e repito, voltemos o nosso olhar para dentro!
Texto escrito por Amanda Balielo, Mãe da Laís e do Gael, Coach de Mães e participante da turma 4 do Zum Zum de Mães.
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